quinta-feira, 7 de abril de 2011

ONGs e Estado: terceirização ou parceria?

As instituições não governamentais tornaram-se alternativas para a falta de investimentos públicos. Em JF elas são responsáveis pela maioria das políticas sociais

No decorrer do século XX, especificamente após a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1941), o mundo viu surgir um novo padrão de políticas públicas e sociais: o chamado Estado do Bem-estar Social ou Welfare State. Neste sentido, o Estado tornou-se o responsável por suprir as necessidades dos cidadãos nas mais diversas áreas, como saúde, educação e renda, dentre outros, considerados serviços como direitos básicos da população. No Brasil, o Estado do Bem-Estar Social ganhou força durante a ditadura de Getúlio Vargas (1930 – 1945) e conquistou seu apogeu ao longo do período da ditadura militar (1964-1985). Com o fim do antigo regime iniciou-se seu declínio.

Dessa forma, a criação das organizações não governamentais (ONGs) relaciona-se diretamente à extinção das políticas do Welfare State e ainda à consequente queda de investimentos públicos na área de assistência social. O surgimento dessas instituições no Brasil se deu na década de 90, ainda no governo de Fernando Collor (1990 – 1992), quando se iniciou a política neoliberal de corte de investimentos públicos. Era o começo do chamado Estado Mínimo, que teve seu ápice no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC).

Com menos investimentos públicos, a sociedade viu-se obrigada a buscar outras maneiras de suprir suas demandas, cada vez mais crescentes. Para a cientista social Anete Negreiros, “o processo de ‘ONGzação’ também é resultado do Estado Mínimo. Esse Estado transfere para a sociedade parte de suas responsabilidades, sobretudo, na área social”. Já Renato Lopes, presidente de duas ONGs e uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) em Juiz de Fora (MG), pondera que “você tem um Estado que acaba incentivando isso. Um exemplo foi a criação da lei das OSCIPs pelo FHC. É uma lei que cria entidades diferentes da ONGs, cuja proposta é a terceirização de políticas publicas”.

Segundo dados da última pesquisa do IBGE, realizada em 2006, nesta época já existiam 16.089 entidades de assistência social privadas e sem fins lucrativos no Brasil. Minas Gerais era responsável por abrigar 14.8% desse total, cerca de 2.391.


A realidade de Juiz de Fora

Não há pesquisa formal que aponte o número de ONGs ou Associações Sem Fins Lucrativos na cidade. Porém, o aumento no número de instituições de auxílio social na região é visível. Atualmente, Juiz de Fora possui o Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), órgão responsável por dar assistência administrativa às entidades afiliadas. No último levantamento feito em 2010, já eram 109 instituições cadastradas. Além disso, o conselho é também é responsável por efetuar os repasses financeiros às entidades. “O Conselho Municipal tem uma regra: só as repassa [as verbas] por um ano, e sua renovação pode acontecer apenas até o terceiro ano. É interessante porque faz a ONG pensar em sustentabilidade; mas as ONGs não têm uma cultura de sustentabilidade. Então, o que acontece depois? As ONGs acabam”, conclui Renato.

Atualmente a maior parte dos serviços de assistência social de Juiz de Fora é feita pelas ONGs ou por projetos do Governo Federal, como o Bolsa Família. “A gente percebe que Juiz de Fora não teve uma grande ação do Estado, sinceramente falando. Eu percebo aqui poucos projetos sociais estatais, e sei disso pela relação que tenho com o próprio Estado”, ressalta Lopes.


Parceria entre ONGs e Estado

A “quebra” das ONGs faz com que a sociedade tenha uma prestação de serviços oscilante, o que interfere também na credibilidade das instituições não-governamentais. É justamente neste ponto em que as políticas sociais públicas devem intervir, estabelecendo uma relação complementar às ações da prefeitura. Segundo o assessor da Secretaria de Assistência Social de Juiz de Fora, Jeferson Rodrigues, “o que funciona mesmo é a questão da parceria”. Renato Lopes concorda: “As ONGs são grandes parceiras do Estado porque elas estão lá na comunidade, elas conhecem as realidades da comunidade, convivem lá. Acho que a ONG pode ser grande parceira; não terceirizando serviços do Estado, mas assessorando, acompanhando”. Lopes destaca ainda que “dependendo do ângulo que você olha é culpa nossa mesmo [das ONGs], na medida em que as entidades fazem com que fique quase cada um por si”.

O desafio de hoje na relação entre ONGs e Estado é identificar qual é o meio termo, até onde vai a responsabilidade de cada um no desenvolvimento e na aplicação das políticas sociais. Anete Negreiros ressalta que “a natureza dos projetos é diferente. O Estado realiza políticas sociais, as ONGs projetos sociais. Política é mais ampla, mesmo que focalizadas para determinado segmento. Os projetos desenvolvidos pelas ONGs são focados em segmentos sociais, regiões e têm uma especificidade e uma estrutura mais reduzida”.

Nenhum comentário: