domingo, 20 de junho de 2010

Travesseiros ou Vuvuzelas?

Acordei. Reclamei mentalmente durante alguns minutos por ter que levantar precocemente. Naquele momento o pensamento mais sensato em minha mente era pular da ponte mais próxima, para ver se, enfim, poderia ter algum momento de paz e descansar durante mais algum tempo. De início, uma eternidade já bastaria. Passar 90% do tempo no trabalho até que é fácil; o grande problema é ser obrigado conviver com algumas dúzias de vuvuzelas no restante do tempo. Na minha infância elas já existiam, mas não me lembrava do seu natural e mágico potencial infernizador. Vai ver é um problema sintático-morfológico, já que eu as nomeava simplesmente como aquelas cornetas grandes. Ou então vai ver a grande questão era eu pertencer à infância: inserido no meio, talvez não pudesse percebê-lo claramente. Um dia ainda pergunto para minha mãe se eu fazia parte da tribo dos vuvuzeleiros enlouquecidos ou coisa do tipo, como parece existir hoje. Fica pra outra hora. Afinal, as cornetas grandes já ganharam bastante atenção da mídia brasileira.

A questão é que essa facilidade pós-moderna de intercambiar a cultura e peregrinar por tantas ideologias me assusta. Bebemos Coca-cola enquanto lemos um bom livro de Marx; logo depois, passamos no Mc Donald's e tomamos um sundae enquanto xingamos o capitalismo selvagem e o governo, para depois abrirmos uma revista Veja e balançarmos a cabeça num ritmo incontido, indicando uma concordância natural. Tudo lindo e ideologicamente incorreto, de acordo com o mais recente Código de Posturas Sociais Médio-Classista. Simples assim. Ah, não se assuste. Não vou ficar jogando por aí meu posicionamento ideológico. Essa crônica não se presta tanto para isso. A ideia inicial era falar de japoneses. Falemos, portanto.

Com o mau-humor típico das quintas-feiras me acomodei no ponto de ônibus. Comecei a observar ao meu redor, e lá estavam os japoneses. Um dos meus passatempos preferidos é observar as outras culturas: hábitos, comportamentos peculiares, tudo me encanta. Apesar de nunca ter saído do sudeste brasileiro, sei reconhecer um gringo à distância. Nesse caso foi mais fácil, e nem precisei de alguma habilidade específica. Os focos de minha atenção, além dos olhos puxados, falavam japonês e carregavam um grosso dicionário da língua portuguesa. Uma garota me chamou a atenção: ela carregava uma bolsa com o emblema da Hyundai. Comecei a pensar naquela questão do Marx, em capitalismo, exploração do trabalho e todas as derivações teóricas possíveis. Depois de alguns minutos de devaneio, voltei à realidade. Espantei-me quando percebi que a japonesa da Hyundai me olhava, sorrindo. Abandonei completamente a discussão teórica que tomava conta da minha mente e comecei a pensar no que aquilo significava. Será que sorrir, no Japão, significaria um “flerte”? O que ela estava querendo dizer com aquele olhar? Por fim, deixei minha presunção de lado e comecei a achar que me empolguei demais com minha argumentação interna. Vai ver eu estava falando sozinho e não pude ouvir direito, por conta do barulho das vuvuzelas. O ônibus chegou e eu fui embora, ainda sem entender nada da cultura oriental. Paciência...

É, o intercâmbio cultural me surpreende. Só que, da próxima, em vez de vuvuzelas, alguns travesseiros poderiam ter virado a sensação da Copa do Mundo. Eu não pensaria em pular da ponte, e a insônia dos brasileiros teria um novo e forte inimigo. Ah, e certamente eu conseguiria ouvir melhor os meus pensamentos. De tabela, eu decifraria os pensamentos uma oriental. Quem diz que Copa do Mundo é só felicidade ainda não conhece a frustração de não conseguir interpretar um sorriso.

2 comentários:

Caio Paranhos disse...

Grande Texto

Rayan Siqueira disse...

Enfim foi-se a era das vuvuzelas!
4 anos de descanso ..